top of page

Mulheres debatem cárcere, direitos e acesso à universidade pública

Em live, Amelinha Teles, Geralda Ávila e Miriam Duarte discutem experiências na prisão e destacam papel do curso da UFABC para emancipação e conhecimento de direitos

 

Equipe Educação Liberta


Amelinha Teles, Miriam Duarte e Geralda Ávila participam de live da UFABC


Com trajetórias marcadas pela prisão, a militante feminista, diretora da União de Mulheres de São Paulo, coordenadora do Projeto Promotoras Legais Populares, Amelinha Teles, a socióloga Geralda Ávila, coordenadora da cooperativa Libertas e voluntária na Pastoral Carcerária e a educadora Miriam Duarte, fundadora Associação de Amigos e Familiares de Pessoas Presas (Amparar) debateram as experiências de mulheres e pessoas não binárias no sistema prisional.


Na live “Mulheres, cárcere e direitos – educação, emancipação social e o papel das universidades”, mediada pela professora e socióloga da Universidade Federal do ABC, Alessandra Teixeira, as participantes compartilharam experiências e expectativas para a 2ª edição do curso gratuito “Educação Liberta – Mulheres e Emancipação Social”, oferecido pela UFABC e coordenado também pela socióloga e professora Camila Nunes Dias.


Geralda e Miriam, que participaram da primeira edição online, acreditam que o curso é uma iniciativa inovadora por aproximar mulheres que sobreviveram ao cárcere e familiares de pessoas privadas de liberdade da formação acadêmica oferecida pela universidade pública.

A prisão causa danos irreversíveis na vida. O curso as ajudou a falar sobre suas vidas, do racismo e dos preconceitos que sofrem” (Geralda Ávila)

A Cooperativa Libertas, entidade parceria do curso “Educação Liberta” começou as atividades no Centro de Progressão Penitenciária Feminina do Butantã, a partir de aulas de costura a mão e ginecologia autônoma. Ao se deparar com o aumento do encarceramento feminino, Geralda conta que passou a refletir sobre as mulheres atravessadas pelo cárcere. “Elas ficam sozinhas a mercê de todas as mazelas. Fizesse sol, fizesse chuva, elas estavam lá para visitar os homens, mas as filas de visitas às mulheres presas ficavam vazias.”


No encontro virtual, a socióloga detalhou o trabalho de acolhimento realizado pela cooperativa. “Recebemos mulheres que saem da prisão para que se sintam ‘gente’”, diz. “Essa é uma expressão que sempre ouvimos: ‘aqui a gente se sente gente’ porque ao longo da vida se sentem rejeitadas’”. Segundo a coordenadora da entidade, a prisão é a “chancela” para serem tratadas sem dignidade. “A história de vida delas não pode ser ignorada.”


Geralda ressalta que o conhecimento adquirido na edição anterior do curso as ajuda a enfrentar problemas no dia a dia. “As que fizeram o curso do ano passado tem muito mais confiança, autoestima com esse conhecimento adquirido. Elas continuam levando enquadro da polícia, mas sabem responder sem ser ofensivas”, afirma. “É de um valor muito grande entrar na universidade e sentar naquele banco junto com as pessoas que estão ali.”


Dores que se transformam em luta


A educadora Miriam Duarte, aluna do curso na edição online e fundadora da Amparar, trabalha com pessoas privadas de liberdade há 24 anos. “Nunca vi pessoas darem uma formação tão rica de conhecimento para famílias de visitantes do sistema prisional e para sobreviventes”, diz. “Foi algo inovador, um olhar de preocupação para tudo o que vem ocorrendo lá dentro. Falar do cárcere é doloroso para quem está lá e para quem visita.” Miriam lembra da relevância dos espaços de convivência e apoio a essa parcela da população.

Quando nossos filhos são torturados, sentimos nos nossos corpos as dores, que se transformam em luta para a gente poder sobreviver. Hoje tentamos mudar a palavra sobreviver para apenas viver”. (Miriam Duarte)

Segundo ela, o tempo no cárcere impacta na vida dos familiares. “Chegam informações mães que adoecem, não conseguem lidar com a situação do filho ou da filha, chegam a óbitos ou tem corpos mutilados por não suportarem a dor”, ressalta. “Por isso, é importante resgatar as histórias dessas pessoas vivas.” A Amparar também trabalha com o acolhimento de pessoas que deixam as prisões mas, sobretudo, com o apoio ao encaminhamento jurídico.


Mãe de três filhos com passagem pelo sistema socioeducativo, dois assassinados e um vítima de AVC (Acidente Vascular Cerebral) após ter deixado a prisão, Miriam lembrou de traumas que permanecem na vida de pessoas privadas de liberdade. “Muitos alimentos que a gente preparava no período da prisão, não fazemos mais porque lembram o sistema prisional”, diz.


Para Miriam, o curso oferecido pela UFABC provou mudanças de atitude entre as participantes. “Algumas mulheres não viam o grito do companheiro ou o fato de ele deixar tudo para elas fazerem como violência. A partir do curso, ela mudou a história dentro de casa e conseguiu mostrar a realidade para a vida do companheiro”, lembra Miriam. “O curso conseguiu trazer essa abertura de olhos: essas mulheres que passam por muitas violências institucionais vão conseguir perceber essas muitas violências.”


Acesso a direitos


A militante Amelinha Teles recordou o período em que foi presa e torturada pelo DOI-Codi na ditadura militar. “Sou uma sobrevivente, fui presa política e a presa política é uma mulher presa como outra qualquer”, disse. “Na época, eu era mãe e uma mulher presa com seus filhos sequestrados sem saber onde estão. Foi nessa condição que me vi, aprendi e tive que reinventar a maneira de viver para ser uma sobrevivente.”


Amelinha ressaltou os estigmas deixados pela prisão. “A cadeia é o mundinho e aqui fora é o mundão. Quando você vem para fora, não pode nem dizer que já foi presa porque há uma rejeição grande da sociedade. Somos muito estigmatizadas”, disse a ativista. “Para sobreviver a gente tem que resistir, lutar e acreditar.”


A militante, que é coordenadora do Projeto Promotoras Legais Populares, ressaltou a importância da luta pela igualdade de direitos dentro e fora da prisão. “Pensamos em concretizar esse projeto para que mais mulheres conhecessem como se formaram os direitos e pudessem defender a si próprias e conhecer o território em que você está vivendo, trabalhando e estudando”, disse ela.


Amelinha destacou que o curso oferecido pela UFABC evidencia o papel da universidade pública à produção e à democratização do conhecimento. “Muitos projetos de pesquisa vão nascer desses encontros”, diz ela. A militante defende a importância de se estudar a contribuição das mulheres à história do país.


“Você se sente mais empoderada quando você sabe o que se está falando e o acesso aos direitos propicia isso. Sobreviver é resistir, para isso, precisamos ter conteúdo, democracia e justiça”. (Amelinha Teles)

A conversa ocorreu na noite da terça-feira (14) e foi mediada pela professora Alessandra Teixeira, que destacou que entre os principais objetivos do curso está o fornecimento de ferramentas teóricas e conceituais para mulheres egressas do sistema prisional e seus familiares. “O curso tem a proposição de ser um espaço de trocas e vivências como um processo de educação deve ser”, disse ela. “É um espaço historicamente negado à grande maioria da população, então, é muito importante que seja ocupado.”


Para conferir a live na íntegra é só clicar aqui.

Recent Posts

See All

Lista de Selecionadas

Equipe Liberta Segue lista das pessoas selecionadas. Nos vemos no curso em agosto! Em breve entraremos em contato com mais informações...

コメント


bottom of page