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Egressas do sistema prisional debatem gênero, punição e classes sociais

2º Encontro virtual do curso Liberta UFABC discute feminismos, direito das mulheres em situação de cárcere, capitalismo e criminalização da pobreza


Equipe Liberta UFABC

 

Feminismos, direitos das mulheres no cárcere e criminalização da pobreza foram os temas abordados durante o segundo encontro do Curso Educação Transforma, Liberta e Emancipa Vidas, promovido por professores e alunos da UFABC, no sábado (2). O encontro destinado a mulheres que passaram pelo sistema prisional e familiares de pessoas que cumprem pena em unidades prisionais teve a presença de mais de 30 pessoas.


Dividido em dois momentos, o encontro começou com uma aula da professora e socióloga da UFABC, Alessandra Teixeira, para explicar a existência de diversos tipos de feminismo e de temas como divisão sexual do trabalho, violência doméstica e de gênero, direitos reprodutivos e sexualidade. “Feminismo é a luta pela igualdade entre homens e mulheres. Trata-se de um movimento muito importante pela igualdade, mas tem que contemplar a luta de todas as mulheres. A luta contra o racismo atravessa todo o feminismo”, afirmou.


A professora explicou que alguns problemas sociais afetam de forma diferente mulheres brancas e negras. “O aborto, por exemplo, é realizado de qualquer jeito. Mas as mulheres negras e pobres sofrem mais violência”, disse. “Se não reconhecermos que existe uma desigualdade que atravessa as mulheres de formas distintas, talvez o feminismo não transforme a sociedade.”


A fundadora da Libertas Cooperativa, Geralda Ávila, ressalta que muitas mulheres se articularam no passado para defender seus direitos sem conhecer os movimentos feministas. “Na década de 1950, minha mãe já era feminista, mas ela não se nomeava. Ela agia como uma feminista”, disse. A aluna Cynthia, que também passou pelo sistema prisional, afirma que mesmo quando uma mulher tem direito à visita íntima na prisão, uma série de mecanismos de controle incide sobre elas. “Supondo que uma mulher presa possa receber a visita íntima, existe uma preocupação muito grande de que ela não engravide”, diz. A aluna Eliana afirma que somente com a educação sexual e a abordagem de temas como drogas e suicídio é possível alcançar uma sociedade melhor.


Cynthia relata que após a experiência no cárcere passou a ter uma posição antirracista. “Me considerava super feminista, mas tive que passar pela experiência da prisão para ter noção da minha branquitude. A prisão me ajudou muito a ver outras mulheres e todos os benefícios estavam ligados à minha branquitude”, afirma. “Para mim foi muito difícil ver o quanto o meu discurso não colava quando pensava, por exemplo, na exploração de mulheres não brancas no serviço doméstico. São privilégios que estão tão naturalizados que a gente só vai perceber quando a gente observa o outro.”


A socióloga e professora da UFABC, Camila Nunes Dias, ressaltou que a desigualdade de gênero é estrutural na sociedade. “Há uma sobrecarga mental produzida nas mulheres e não há um reconhecimento disso, há uma naturalização. Já mudamos muita coisa, mas há muita coisa para mudar.”


Classes sociais e punição


A economista e professora e doutoranda pela UFABC, Josiane Brito, ministrou uma aula sobre classes sociais e punição. No debate, as alunas falaram sobre como as relações do capitalismo marcam as vidas de mulheres egressas do sistema prisional e de mulheres com familiares que passaram ou estão em penitenciárias de todo o país. “Vivemos em um contexto em que vemos e sentimos os efeitos de um Estado mínimo, que, entre outras ações, desmonta políticas públicas, a legislação trabalhista e previdenciária, e um Estado penal, que é o Estado fortalecido em suas estratégias punitivas, em que a criminalização da pobreza e o encarceramento em massa são processos centrais.”


O objetivo da aula “Punição e classe social” é apresentar e discutir os processos econômicos, políticos, culturais e sociais que colaboram para essa realidade. “As alunas se mostraram interessadas, trazendo questionamentos e experiências que enriqueceram a aula”, disse a professora. Para Josiane, as discussões propostas na aula contribuem para evidenciar as origens e razões das desigualdades existentes. “Esse entendimento nos permite identificar nosso lugar no mundo, enquanto corpos marcados pela classe, raça e gênero, desconstruindo discursos hegemônicos e nos mostrando que o estado de coisas em que vivemos não é natural e pode ser mudado.”


Dessa forma, as alunas compreenderam como a criminalização está relacionada às classe sociais. “O tráfico não é criminalizado de ponta a ponta, é criminalizado por setores, atravessado por questões econômicas e políticas”, disse Cynthia. “Quem está preso são aqueles que estão na base, em funções subalternas. As mulheres sempre ocuparam posições subalternizadas. No presídio, elas têm um menor acesso aos direitos jurídicos. A prisão tem classe e raça”, afirma.


Por fim, Camila explicou ainda como o processo de criminalização afeta pessoas de diferentes classes sociais. “O pobre comete mais crime do que o rico? Não. O que acontece é que pessoas que cometem crimes como lavagem de dinheiro, corrupção entre outros, são punidas de uma outra forma que não com a prisão”, afirma. “Quando você olha para a prisão, quem está lá são pessoas que cometeram crimes como roubo, furto, lei de drogas. Nosso sistema carcerário é o retrato do quanto o capitalismo tem tudo a ver com a punição. Quem está preso são aqueles que não têm dinheiro.”


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